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terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O guardião das sombras- por mala nihil

Eu vou agora contar aquele pesadelo com um personagem entitulado por mim, "guardião do sótão". Texto apagado do ex-gd do Terra, e que me serviu de inspiração para o conto "Quase um Brâmane".

Devaneio que me deu em seguida um motivo para viver, que é a investigação dos problemas da mente.


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À semelhança do que ocorreu ao Angulimala- em sua infância- eu também fui uma menina muito "mansa". Eu nem parecia ser desse mundo.
Tenra, afável, delicada, com uma verve poética.
Todavia, uma menina de estatura maior do que a minha- apanhou de mim- ao tentar me bater- o que me levou a ter medo dos meus impulsos.
Mas, a fama "de que eu podia me defender" garantiu minha paz  nesse tempo- e evitou que eu sofresse bullying. Pude continuar a ser aquela garota "etérea" por mais uns anos.

Eu sempre tinha perguntas difíceis a fazer aos entendidos, e ficava muito atenta aos temas sobre religiosidade que eu via na televisão, e que eu ouvia no rádio. Fui logo me interessando pelo budismo- e comecei a ler sobre o tema em seguida.

Mamãe se assustou quando uma vez eu perguntei a ela "o que faz um hitler ser um hitler", ao que ela respondeu, nervosa:

"_Como vou saber - se nunca fui assim?       ..."

...então eu vi que esse realmente era um caso difícil.

Bem, chegamos assim ao ano de 1.980. Abertura política no país- e todo o conteúdo da mídia já antecipava o futuro neoliberalismo da era FHC.
As novelas estavam bem desembaraçadas em seus temas.
As emissoras de rádio veiculavam bolerinhos renovados.
Então- eu adormeci no dia dezenove de abril desse ano, uma pessoa, e acordei no dia seguinte- já sendo outra.

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Levada pelas minhas curiosidades intelectivas, eu subi ao sótão de casa.
Na minha casa pequena, naquele tempo, não havia sótão, e esse lugar foi acrescido ali, pela minha imaginação.
Eu - com a desculpa de querer  fazer ali uma faxina, e de desejar eliminar aranhas e cobras que por lá podiam haver(eu era boa para eliminar aranhas e cobras- morávamos no interior, nessa época)- fui lá,quando na verdade, eu queria consultar mesmpo- era aos livros velhos,amarelados e empoeirados que sabia que por lá encontraria.
Qualquer filósofo turbilhonador- que podia ser principalmente o Niet, iria me satisfazer.

Ao chegar ali, eu vi o homem-monstro.
E recuei um instante.
Ele me falava com uma voz fina, de falsete.
Tivemos uma conversa muito tensa.
Perguntei ao mesmo quanto perigo ele me oferecia. Se ia fazer alguma coisa contra mim. Eu não conseguia fugir- embora soubesse que devesse fazer isso.

Ele falou que era realmente perigoso.
Que podia fazer muito contra mim, e contra todos os que eu encontrasse.
Mas, que era um monstro honesto e de bom caráter.
Prometeu que se eu fôsse embora, que se eu não fôsse curiosa a respeito dele, e que se eu trancasse a porta do local onde ele se encontrava, ele jamais ameaçaria ninguém.

Eu não tive dúvidas.
Dei meia volta, e fiz o que ele mandou.

Horas depois, eu estava ali de novo,com meus familiares, e falava, no meu estouvamento de adolescente, algo como:

"_eu vi, juro que vi, e ele agiu assim, e agiu daquele modo.Eu quero que vcs vejam. Nâo o incomodem, mas por favor, prestem atenção nele."

O homem-bicho não estava mais lá.
Ainda assim não fiquei como mentirosa perante os que me conheciam. Eles apenas acharam que eu havia tido uma alucinação, que eu havia visto um fantasma, e me disseram que eu não precisava me preocupar.

Horas depois, eu voltei ali,e vi o monstrinho, dormindo seu sono eterno e quase invencível- semelhante ao dos vampiros de filmes de terror.
Fui embora, e conforme prometi, passei a respeitar sua privacidade.
Mas, eu disse ao meu irmão Contravocê algo como:

_"Parece que ele só é visível para mim,e assim mesmo- quando estou sozinha".

Os anos- no sonho - se passaram. Eu - esporadicamente ia lá,para buscar um objeto ou outro, ou para ficar ali lendo livros antigos,mas sempre trancava a porta o entrar e ao sair.
No inicio da minha idade adulta, quando eu me vi com a aparência que tenho hoje, eu vi o "mestre-bicho" acordar, e me dar um alozinho.
Em seguida, ele voltou a dormir.
Eu fui embora de novo, e conforme prometido, tranquei a porta.

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Acordei de madrugada, estremecendo, suando frio. Fui à cozinha tomar um café forte.
Me parecia que eu havia tido um encontro com a loucura.
No dia seguinte, contei o pesadelo a alguns, e um deles, para "ajudar" ainda disse que eu havia sonhado com um feiticeiro. O que me deixou com mais medo.
Muitos anos depois, muitos anos mesmo- fui entender que Angulimala foi um mau devoto da deusa Kali...a deusa mal interpretada como deusa da destruição.

Comecei, obstinadamente - a ler sobre a mente humana,sobre a loucura, e acabei me interessando por psicologia profunda, por psiquiatria,por saúde, etc.
Entendi finalmente, que o cérebro- em princípio- é um atributo orgânico - e que dele,não podemos abusar,bem como que a saúde em geral,influencia no desempenho.
Não foi preciso muito tempo para eu interpretar meu pesadelo como uma ordem do meu inconsciente para manter trancados "meus impulsos ruins" e para eu não ficar curiosa "pelo meu passado" , pois ele não tinha nada de muito bom a me contar.
Todavia,no sonho, eu desobedeci parcialmente, a "fera", e acabei conhecendo o sótão,bem como sua biblioteca.

O paralelo que isso teve com minha atitude real,foi eu ter escrafunchado esses signos e meu inconsciente,até chegar no "homem da mala", ou como queiram...(hahahah...)

Quando eu comecei a escrever aquele meu conto para o gd do Terra no ano passado, eu sonhei novamente com o homem monstro. Ele estava bem acordado e não gostou muito do que eu fiz.
Eu tranquei a porta depressa, e deixei ele lá dentro.

Acredito que o sr.Monstro tratou de arrumar uma série de problemas para me impedir de concluir aquela monografia.
Eu não consegui completá-la, porque acabei muito cansada,e suponho que ele justamente, procurou me provocar esse cansaço.

Agora, ele novamente vive em paz,servindo a mim como motivação para minhas investigações sobre a "natureza da alma" por toda a vida.


Em tempo:

eu fui uma jovem muito ajuizada,e nunca tive atitudes autodestrutivas.

Acho que todo mundo precisa de um "guardião de sótão" severo assim, e bem semelhante ao demônio que assombrava o filósofo Sócrates, toda vez que ele estava para errar em algum coisa importante.

Um comentário:

  1. Eu também vejo esse personagem como um possivel símbolo da descoberta da minha sexualidade- bem como o vejo como um tipo de remorso que posso ter sentido pela busca do conhecimento- do modo como eu vinha me orientando naqueles anos- pois eu sabia que isso me levaria a uma possível ruptura com os valores tradiconais que me haviam sido ensinados, ainda que mesmo essa ruptura não tenha me impedido de continuar uma figura conservadora em seus ideais e em seus procedimentos.

    Ao longo de 1.980, eu fui ficando mais "fechada" em mim mesma e mais brava.Deixei de ser a sonsinha de antes, embora eu continuasse simpática.

    Poucos dias depois daquele devaneio,me apaixonei numa noite de lua cheia,por alguém a quem eu tinha visto duas ou três vezes, quando eu era menor(ou mais criança).
    Entendendo finalmente porque eu não conseguia gostar de ninguém(aquele menino fazia parte do meu imaginário)- consegui o "objeto amoroso desejado" por um tempo.

    Na verdade, eu tenho para mim esse ano como o mais feliz da minha vida.

    As coisas seguiram seu rumo.

    Hoje em dia, eu escrevo num gd,onde tem um escritor que costuma escrever seus devaneios de porão, e contar sobre como um amor o levou a ser tudo o que ele é hoje em dia.

    Eu devo tudo o que sou, ao meu encontro com a "loucura", e idem, ao meu primeiro amor.

    Em cima disso tudo, formei os valores de uma vida.

    E em nossos espaços, o abismo de cima costuma sorrir para o abismo de baixo.
    Sótãos e porões dialogam entre si.
    (o sótão é como eu imagino o subconsciente do cérebro, e porão é como o sr.Ícone imagina "o foro íntimo) Mas literalmente, habitamos mesmo um sótão(eu) e um porão(ele)

    Por ora é tudo, tavez eu voltarei daqui a pouco.

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